CONTOS E PONTOS

© Augusto Fernandes© Augusto Fernandes© Augusto Fernandes

Proposta:

Desafiamos o artista em residência Henrique Neves a co-criar uma instalação participativa com uma das moradoras e comerciantes do Intendente - Rosa Riveiro - cuja lavandaria sempre foi um ponto de encontro e apoio social, mais conhecida por lavar "corações" para além das roupas que ali chegavam com ou sem dono.

Em Maio de 2013, nas Experiências do Lugar, o LARGO Residências promoveu um conjunto de workshop com a duração de 4 sessões, onde se transformaram roupas abandonadas (esquecidas ou deixadas) na lavandaria da Rosa, por antigos clientes e amigos, nuns lindos toldos que desejam trazer a sombra ao Intendente.


Equipa:

Co-criação: Rosa Riveiro e Henrique Neves

Coordenação: Susana Alves

Textos: Maria Manuel Pedrosa e Ana Jaleco

Fotografias: Augusto Fernades

Participantes do workshop: Balbina David, Patrícia Camilo Santos, Célia Fontes, Tatiana, Orsola Bertonelli, Maria Glória Guedes, Mariana, Ana Júlia Filipe, Cristina Santos, Joana Madeira, Afonso Alves, Rita Mata, Susana Tenda, Maria Helena Furtado, Belmira, Conceição Francisco, Maria Manuela Vieira, Mariette, Benilde Cadinho, Carolina, Ana Regedor, Vanessa Badagliacca, Débora, Sílvia Felix, Rita Cattitas, Celia Riveiro

Agradecimentos: Dadá, Casa dos Amigos do Minho, Lavandaria Rosibouquet

Apoios: Câmara Municipal de Lisboa, Orçamento Participativo, no âmbito do Plano de Desenvolvimento Comunitário da Mouraria


Sinopse:

"As camisas que agora são sombras bordam um mosaico de histórias e episódios de vida únicos e irrepetíveis. De pessoas que cresceram sem equidade, em terras nas quais o mais difícil de fazer é mesmo o mais fácil: fugir. De pessoas que foram atrás de um ponto de interrogação alinhavado mas sempre preferível ao ponto de cruz deixado para trás. Porque a busca de algo melhor e a curiosidade farão sempre o ser humano caminhar. De pessoas que se perderam e nunca mais se encontraram, como a agulha no palheiro. De gente com vidas de linha recta, mas que a máquina (não de costura) deixou aos ziguezagues. Muitas destas camisas pararam aqui porque os donos não param, andam de margem em margem, de porto em porto, imaginário ou não. Outras ficaram aqui do avesso, como a vida de quem a vestiu. Muitas apenas esquecidas na espuma dos dias.

Somos levados a sentir algum pudor em remexer em algo que nos pertencia, as coisas nunca são anónimas. E as roupas menos ainda. Cultivamos a posse individualista. Temos de reconstruir o sentido do colectivo, para conseguirmos prosperar. Afirmamos essa ideia nestes toldos. Cada camisa sozinha já nada valia, mas unidas por mãos com vontade, linha e agulha voltam a ter um propósito. Juntas, cobrem o corpo. Do Sol."

(...)

"Aonde vais de camisa engomada?

À procura de quem me queira, para uma jornada.

De onde vens com a camisa sarapintada?

De tornar a cidade dos outros embelezada.

Aonde vais com essa roupa tão ausente?

Quem não tem carimbo, irmão, não está presente.

(...)

"Branco.

Mas branco não é uma cor.

O que é que isso interessa ‘práqui’, ninguém ainda falou em “cor”, sequer.

Mas os panos estão todos juntos porque são brancos. Então meteram de parte todas as outras cores? Está mal.  Acho uma discriminação, para não dizer outra coisa."

(...)

“Desbotada? É preciso ter lata!”, a primeira voz vinha da frente de uma camisa, realmente já coçada do uso. “Trabalhei muito, o que é que pensas. Pegava sempre às 8h00, até aos sábados. Já tu deves pertencer a uma camisa de ir à missa.”, defendeu-se.

(...)

Tudo começou com uma velha máquina de costura de seu nome Oliva que, no canto de uma das muitas salas da cidade, trauteava nostálgica e incessantemente a melodia: “Ó Rosa arredonda a saia, ó Rosa arredonda-a bem, ó Rosa arredonda a saia, olha a roda que ela tem”.

(...)

A roupa é a nossa alma gémea. Somos nós por dentro e a roupa por fora. Esta era a máxima de Casimiro. Lavada, engomada, cheirosa. Tentava ter sempre dinheiro para pagar na lavandaria as sete camisas compradas a dedo. Uma até tinha custado um quinto do seu salário.

in cadernos “Contos & Pontos”

 

 


A partir de: 
1 de Fevereiro de 2013 to 26 de Maio de 2013

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